segunda-feira, 27 de junho de 2011

(pag 40)

Como a essa altura eu já tinha certeza que o problema era somente a bomba d'água, resolvi arriscar, comprei somente a peça e no pior das hipóteses também comprava um punhado de ferramentas e eu mesmo iria tentar trocar.

Porem, toda loja de pecas de carro que se preze tem sempre um mecânico entrando ou saindo. E essa seria a melhor oportunidade de conseguir um preço mais justo, afinal eu já conhecia o problema, já estava com a peca comprada nas mãos, faltava apenas negociar a mão-de obra, mas era justamente essa a pior coisa a se negociar nos EUA.

Cheguei ao primeiro homem com mãos sujas de graxa, obviamente um mexicano, e perguntei quanto ele cobrava para deixar novamente o carro em ordem.

O homem olhou-me fixamente por alguns segundos e sem nenhum pudor disse um previsivel preço exorbitante. Obviamente não aceito por mim. Ate mesmo porque não tinha todo o dinheiro.

Com a mesma cara de despudor, olhei-o nos olhos e perguntei quanto ele cobrava para me emprestar as ferramentas para eu mesmo fazer o conserto (mas confesso que sem ao menos fazer ideia de como eu o faria).

Se num jogo de poker um bom blefe eh decisivo, no jogo da vida as vezes blefar faz parte da sobrevivência.

O homem mudou de feição e baixou para um terço do montante inicial, afinal ele imaginou que eu pudesse fazer o serviço, e caso ele não baixasse o preço, eu mesmo faria e ele perderia o cliente.

Mais importante do que saber blefar eh saber a hora de aceitar uma contra-proposta, e alias a dele obviamente foi aceita.

Apesar da proposta aceita eu sabia que o preço final era exatamente tudo o que eu tinha no bolso.

E esse "tudo" não e força de expressão, eram simplesmente todas as notas verdes que eu tinha na carteira.

Com o conserto já sendo realizado, tentei mais uma vez negociar pelo menos vinte dólares a menos, afim de ter o que comer naquele dia.

Quando me dei conta disso, me senti totalmente fragilizado e não conseguia pensar em nenhuma boa desculpa para fazer o duro mecânico acreditar em mim.

Nessas horas a melhor coisa a se fazer eh contar a verdade, mesmo que essa verdade pareça totalmente descabida, afinal, quem iria acreditar num brasileiro que estava cruzando os EUA de leste a oeste, sem nenhum dinheiro no bolso, dormindo no carro, lavador de janelas e que sequer tinha um cartão de credito nas mãos?

- Claro que não foi um mecânico mexicano que acreditou.

Sem nenhum aparente peso na consciência, afinal ele não acreditava em mim, o máximo que baixou foi exatamente os vinte dólares que eu mencionei, mas claro, com uma contra-proposta.

Ele queria ficar com a camisa do Brasil que eu estava usando.

Sem o minimo de orgulho, tirei a minha camisa e peguei os vinte dólares para pelo menos ter o que comer.

Nunca pensei em um dia passar por isso, ter que vender minha própria roupa do corpo para ter o que comer, ainda mais sendo ela a camisa da seleção do meu pais.

Soava-me como ironia do destino sair do meu pais para passar por isso.

Mas o medo de passar fome, longe não somente da família mas como de qualquer pessoa que você possa contar, eh maior do que qualquer tipo de orgulho ou amor próprio.

Nesse momento senti todo o peso do mundo sob os meus ombros.

Procurei um canto mais escondido, sentei e chorei.

Chorei compulsivamente como nunca havia chorado na minha vida.

Chorei perguntando a esse possível Deus o porque daquilo tudo.

Chorei procurando por uma simples resposta para a mais simples das perguntas: Por que?

Era errado apostar num sonho?

O que eu tinha feito de tao ruim para ter que passar por aquilo?

- Obviamente a resposta nunca veio...chorei sozinho.

2 comentários:

  1. ... Rafa... a resposta divina veio SIM!! Olhe com outra perspectiva... se você não tivesse vestido com a camisa do Brasil, ia ficar sem nenhum dinheiro no bolso pra ter o que comer! Foi nesse momento que seja qual a força que olha por voce (a força do Universo, Deus, anjos, arcanjos, guias esirituais, Jah, Alah, Buddha ou qualquer outra força que não vemos mas que está ali), se manifestou e te tirou do que poderia ter sido uma imensa roubada. A de ficar sem um troco na carteira, por mais que fossem apenas $20! Um dia você talvez perceba de que não está sozinho e nada é por acaso...
    And by the way, chorar faz um bem danado e faz parte do crescimento pessoal!
    Beijo
    xxx

    ResponderExcluir
  2. Rafa,
    também não sou muito, como direi, crédulo.
    mas quem sabe não é essa força maior, seja lá com qual nome for, que nas horas extremas nos dá força, mesmo que seja nos incentivando a desafiá-la, a seguir em frente e não desistir????

    ResponderExcluir